5 de abr. de 2012

17° aniversário da Revista SINFÔNICA.


O seguinte artigo foi publicado em fevereiro de 2012 na página editorial da revista uruguaia “Sinfônica”, celebrando seu 17° aniversário. Com autorização do seu autor, Diego Barreiro Carabetta, reproduzimos aqui a versão íntegra do original em espanhol traduzido para português. É um chamado à atenção sobre o estado atual da música clássica no Uruguai e no mundo. Um artigo para refletir muito.


OS 17 ANOS DA REVISTA SINFÔNICA

   A cada mês de fevereiro, celebrando-se um novo aniversário da revista, fazemos nossa habitual pausa para reflexão. Com esta edição, SINFÔNICA está cumprindo seus 17 anos de vida.
   Sem dúvida, muitos conceitos se reiteram ano a ano, a modo de comum denominador, os que nossos já acostumados e fieis leitores conhecem através desta página editorial. Enorme sacrifício, falta de apoios econômicos necessários para levar adiante a revista com a devida comodidade, e um permanente “tirar força da fraqueza”. Apesar de tudo, hoje esta publicação nacional está celebrando este aniversário, refletido através da edição ininterrupta desde o começo, e durante os 12 meses do ano.

   Sem dúvida, a realidade da chamada “música clássica” em nosso país não aporta muito à difusão do gênero, o que, conseqüentemente, também se reflete em nosso caso no referente à constante falta de apoios tão necessários. Sabemos que esta situação não é exclusiva do Uruguai, e marca realidades e tendências de outros países, o que evidentemente não se justifica como uma desculpa.
   Referente à difusão cultural, devemos esclarecer primeiro que nada, respeitamos todos os gêneros e cada um merece ser difundido, logicamente sempre que seja mediante propostas não discordantes com os necessários valores culturais. Porém, resulta injusto corroborar como permanentemente outros gêneros vão ganhando espaços em detrimento da música clássica.
   Fala-se em “modernizar” a música clássica, em que se precisa mudar e atualizar seu enfoque pensando, especialmente, nos jovens, nas novas gerações. Mas a pergunta é: A música clássica tem que se adaptar aos jovens?, ou se deve formar como corresponde aos jovens para que possam desfrutá-la?
   Nesta edição, na entrevista ao novo Diretor Principal da OSSODRE (*), Maestro Stefan Lano, observa acertadamente que no mundo atual há tendência a incorporar constantemente o aspecto visual, e que existe a tendência de acompanhar a música com projeções visuais de fundo, tema que, segundo ele, coloca uma difícil situação pensando, por exemplo, em concertos sinfônicos.
   Então, um concerto de Mozart ou uma sinfonia de Beethoven precisam ser acompanhados de imagens para resultarem atrativos? , o gênio musical de ambos não é suficiente para os novos públicos?, ambos foram grandes compositores só por mera casualidade?
   Será que hoje já não emociona mais ao público escutar um belo Lied de Schumann ou de Schubert? E se a música subentende algo tão importante para a vida de uma pessoa, como é a emoção, para onde nos levará este caminho? Evidentemente, se deve reconsiderar uma quantidade de coisas.
   Uma pessoa que haja recebido certa formação musical (e não estamos falando em “conhecedores”) não pode deixar de sensibilizar-se diante de uma obra de Mozart, Beethoven, Schumann ou Schubert, só para lembrar alguns dos grandes compositores, e muito menos exigirá complementa-la com efeitos visuais para desfrutá-la.
   Existe a sensação de que o mundo atual está se acostumando cada vez mais a uma “cultura” chata e medíocre. Para este costume, lamentavelmente, contribuem muitos “especialistas” de marketing, a mídia e os “gestores culturais”, dentre tantos outros. Por isso é que atualmente a palavra “cultura” se usa tantas vezes para conveniência de cada um.
   E não por ser reiterativo – já que o tenho citado mais de uma vez – o regente chileno Francisco Rettig, há anos, me disse: “As pessoas amam o que conhecem”. Ou seja, as pessoas são simplesmente o reflexo do que a mídia lhes diz. Por isso, é uma desculpa insustentável o “justificativo” de muita gente perante propostas medíocres dizendo: “Deixa aí, isso é o que todos consomem”.
   Há anos que assistimos a “significados diferentes” do que é Cultura. Hoje pareceria que a Cultura também inclui propostas onde a mediocridade, a chatice, a má palavra e o grosseiro é moeda comum. Então, eu gostaria que alguém me explicasse por que isso deve ser considerado “Cultural”, ao lado de um Mozart ou Beethoven.  

Falávamos da necessidade de “modernização” e “mudança” que muita gente manifesta. Mas neste caso “modernizar” não significa “mudar”, e vamos colocar um exemplo como pode ser Il Trovatore de Verdi. Pode-se fazer uma representação “atualizada” da ópera, incluindo elementos que possam atrair mais ao público atual, mas conservando basicamente o espírito e a inspiração do compositor. Isso, consideramos que é válido.
   Porém, uma coisa bem diferente seria se um “régisseur” pretende dar-lhe, além de um toque pessoal, um enfoque totalmente diferente do Verdi, transformando-a numa obra “nova”, acreditando que isso é “mudar” e “modernizar” em benefício de captar novos púbicos. Isto é um erro porque o único que se consegue é mostrar às pessoas algo que não é Il Trovatore, mas sim, um espetáculo baseado na obra de Verdi.
   Os grandes compositores na história da música clássica atingiram esse setial pelo enorme talento que os inspirou e refletiram nas maravilhosas partituras que, até hoje em dia, seguem conservando todos os seus valores. Isso é algo que “não morre”, que não pode ser submetido a “mudanças”, e além do mais, que podemos seguir desfrutando em nossas vidas.
   Dizia o Maestro John Neschling numa entrevista que lhe realizamos (**): “A arte culta é o melhor companheiro que uma pessoa pode ter na vida”.       
  
Diego Barreiro Carabetta
Revista Sinfônica , Fevereiro de 2012 

(*) OSSODRE: Orquestra Sinfônica do SODRE que é o organismo oficial da radio e TV do Uruguai. A menção corresponde à pág. 4 da publicação do número de fevereiro de 2012.

(**) Número de dezembro de 2011 da Sinfônica.  


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